por: Joel de Araujo
Vamos deixar bem claro que o nosso Código Penal não é um código de direitos, mas de crimes. E assim sendo, todas as condutas lá descritas são delituosas, a menos que se diga expressamente o contrário. Nosso Código Penal em seu artigo 128 apresenta duas hipóteses relacionados a interrupção da gravidez, dizendo “não se pune” o aborto,…,- se não há outro meio para salvar a vida da gestante (inciso I), ou se a gravidez resulta de estupro e se o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal (inciso II). Apesar de entendimentos contrários, é correta a expressão, pois o que a lei está dizendo que não se pune o aborto, o que significa que o fato típico deixa de ser punível, equivalendo a dizer que não há crime. A lei privilegia o médico como agente capaz de providenciar a cessação da gravidez nas duas hipóteses da lei, pelo fato de o médico ser o único profissional habilitado a decidir, principalmente na primeira situação, se a gestante poderá ser salva evitando-se o aborto ou não, o mesmo podendo ser afirmado em caso de estupro, quando a vítima deseja a interrupção da gravidez com segurança. Não há qualquer previsão legal de utilização, mesmo por analogia /in bonam partem /(a favor do réu), de outro profissional ser utilizado, por exemplo a enfermeira ou a parteira, apesar da “barbeiragem”de muitos médicos. Em nome da dignidade da pessoa humana, no caso a mulher violentada, o direito permite que pereça a vida do feto. São dois valores fundamentais, mas é melhor preservar aquele já existente. “Afrânio Peixoto”, jurista e grande doutrinador, no entanto, em posição contrária a essa autorização legal diz:” É santo o ódio da mulher forçada ao bruto que a violentou. Concluir daí que esse ódio se estenda à criatura que sobreveio a essa violência, é dar largas ao amor próprio ciumento do homem, completamente alheio à psicologia feminina, pois um filho é sempre um coração de mãe que passa para um novo corpo”. De certo tempo para cá vem sendo defendida a tese do aborto em caso do feto anencéfalo (aquele considerado sem parte do cérebro), pela analogia /in bonam partem,/ e assim essa situação vem gerando grande debate no meio jurídico, em especial após uma decisão do Ministro Marco Aurélio Mello, que decidiu a favor da interrupção da gravidez, cuja decisão foi cassada pela maioria dos membros do STF. Nesse caso há descrença na própria lei, porquanto se o Código Civil estabelece em seu artigo 2º “ que a lei põe a salvo, desde a concepção,os direitos do nascituro”. Uma vez concebido é necessário esperar o nascimento da criança, posto que seus direitos estão resguardados pela lei, e a vida é protegida pela Constituição Federal como bem maior a ser tutelado. Penso também, ser necessário dar uma oportunidade ao milagre da vida e acreditar nos valores supremos da criação, e no milagre também da boa medicina. Afinal, o avanço da medicina com as questões das “células tronco”, apesar da oposição da Igreja não pode ser descartada, isto quando nos referimos ao anencéfalo.