Mesmo que seja cumprido o que estabelece o artigo 226 do Código de Processo Penal, o reconhecimento pessoal não pode induzir, por si só, à certeza da autoria do delito. E, caso seja feito em desacordo com o rito previsto naquele artigo, o ato deve ser invalidado.
Com esse entendimento, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, invalidou decisão baseada em reconhecimento fotográfico e absolveu um homem condenado por roubo a mão armada.
De acordo com os autos, o homem foi acusado de participar de um assalto, junto com supostos comparsas, a três pessoas que caminhavam por uma rua no Rio de Janeiro. Ele acabou condenado pela Justiça estadual a seis anos de reclusão, em regime inicial fechado, mais multa. Alegando que a condenação se baseou em reconhecimento fotográfico feito apenas em âmbito policial, sem confirmação em juízo — o que invalidaria seu uso como prova —, a defesa impetrou Habeas Corpus pedindo a absolvição do homem.
Responsável por analisar o pleito, o ministro Schietti concedeu a ordem para absolver o homem. O Ministério Público Federal, então, interpôs agravo regimental pedindo a reconsideração da decisão. Segundo o órgão, a condenação em primeiro e segundo graus, na Justiça do Rio de Janeiro, considerou provas produzidas em juízo, e não apenas o reconhecimento do réu pelas vítimas por meio de fotografia.
Ao julgar o agravo, Schietti discorreu inicialmente sobre o artigo 226 do CPP, dedicado ao ato do reconhecimento de pessoas e coisas. Entre outros pontos, o dispositivo estabelece que a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever o indivíduo a ser reconhecido, e a pessoa cujo reconhecimento se pretender será colocada, se possível, ao lado de outras que sejam parecidas com ela, “convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la”.
Na sequência, Schietti lembrou que a 6ª Turma do STJ, ao julgar o HC 712.781/RJ, em março do ano passado, entendeu que, mesmo se feito em conformidade com o modelo descrito no artigo 226, o reconhecimento pessoal não tem “força probante absoluta”. Assim, por si só, tal procedimento não pode levar à certeza da autoria do delito, “em razão de sua fragilidade epistêmica, decorrente da falibilidade da memória humana”.
Quanto ao caso dos autos, Schietti ponderou que duas vítimas, em sede policial, reconheceram “peremptoriamente” o acusado com um dos autores do roubo. Por outro lado, ressaltou o ministro, a leitura do acórdão permite concluir que a condenação se baseou apenas no reconhecimento fotográfico feito no inquérito policial e não confirmado em juízo.
“No caso, como visto, a única prova existente em desfavor do réu foi o reconhecimento fotográfico realizado no inquérito, de modo que a absolvição é medida que se impõe. É pertinente ressaltar, por oportuno, que não se trata de negar a validade integral do depoimento da vítima; mas, sim, de negar validade à condenação baseada em reconhecimento colhido em desacordo com as regras probatórias se não corroborado por nenhum outro elemento dos autos”, explicou Schietti ao negar provimento ao agravo do Ministério Público e, assim, anular a condenação.
fonte: conjur.com.br