O descumprimento reiterado de ordens judiciais por parte de uma construtora e incorporadora em ação de execução motivou o juiz Raphael Garcia Pinto, da 4ª Vara Cível do Foro Regional da Lapa, em São Paulo, a determinar penhora e apreensão de bens na sede da empresa, além da imediata cessação das obras e eventual comercialização de unidades em um lançamento imobiliário de alto padrão.
O julgador fundamentou a sua decisão no artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil, o qual permite ao juiz “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. A Gafisa é inadimplente de dívida em processo transitado em julgado.
Sobre a regra do CPC, o juiz explicou que o seu objetivo é “dar efetividade às ordens judiciais de pagamento de quantia certa, atacando problema já há muito conhecido do processo de execução, evitando-se que sentenças e decisões judiciais condenatórias fossem meros quadros a serem pendurados na parede pela parte vencedora ante a não obtenção do bem material determinado judicialmente”.
Para o cumprimento de suas determinações, o magistrado autorizou o acionamento de reforço policial e eventual arrombamento, se necessário. Em relação ao lançamento imobiliário, localizado nos Jardins, bairro nobre de São Paulo, determinou a lacração de eventual estande de venda que esteja funcionando na obra. “Em suma, deve ser interrompida toda e qualquer atividade no empreendimento mencionado”.
Zombaria
“É comportamento habitual, reiterado, contumaz, da devedora Gafisa, que acredita estar acima da lei, que acredita não ter que cumprir determinações judiciais, que acredita que não lhe é dado pagar dívidas reconhecidas de forma definitivas, neste e em outros processos”, destacou Garcia Pinto. De acordo com ele, “a postura da executada é lastimável, digna de veementes críticas, pois zomba do Poder Judiciário”.
A decisão foi tomada na última sexta-feira (14/4), e nela o julgador classifica como “ínfima e irrisória” a quantia devida (R$ 50.132,65) ao compará-la com o faturamento da construtora. “Segundo dados obtidos em sites especializados de investimento, a executada divulgou aos seus acionistas e investidores receita líquida no quarto trimestre de 2022 de R$ 325,7 milhões”. O valor atualizado da dívida é de R$ 140,3 mil.
Iniciado o cumprimento da sentença, a empresa sempre optou pelo silêncio e nada pagou, conforme o juiz. “Tratando-se de uma das maiores construtoras do país, pesquisa pelo Sisbajud retornou negativa, não se encontrando sequer um centavo em contas bancárias da devedora”, frisou ele. Uma consulta ao sistema Renajud também causou surpresa ao magistrado, porque foi encontrado apenas um automóvel Gol, ano 1996, com restrição.
Após diligências sem êxito, o julgador deferiu o pedido do autor, representado pelos advogados Werner Bannwart Leite, Solange Naressi, Gustavo Henrique Miquelini Arthuzo e Juliana Gabriel, para ser penhorado percentual de faturamento da executada necessário à satisfação do débito. Houve interposição de agravo de instrumento pela devedora, que foi negado. Na sequência, a construtora ignorou a decisão que lhe impôs o depósito do percentual em juízo.
A Gafisa ofereceu à penhora um imóvel em outro município, que estaria em nome de terceiro, sendo a proposta recusada pela parte credora. A empresa também teve rejeitada a tentativa de parcelar a dívida porque o artigo 916, parágrafo 7º, do CPC proíbe expressamente o parcelamento na fase de cumprimento de sentença. A postura da executada de frustrar o pagamento do débito irritou o juiz.
“O Poder Judiciário não pode se tornar refém, não pode ser humilhado e menosprezado pela devedora, como há mais de um ano acontece neste feito e em outras execuções neste juízo. Basta”, assinalou Garcia Pinto. Para o julgador, as suas medidas coercitivas e restritivas são justificadas por estar evidente que a executada não paga a dívida “por capricho e por acreditar estar em um pedestal, superior à ordem jurídica”.
O juiz também determinou a suspensão da página da empresa na rede social Instagram até que haja a quitação da dívida, bloqueando toda e qualquer postagem ou acesso por outros usuários. Para tanto, foi encaminhado ofício ao Facebook para dar cumprimento à ordem. Segundo o magistrado, a Gafisa “se vangloria” pela internet do lançamento imobiliário nos Jardins.
fonte: conjur.com.br