Por: Daniele Wahl de Araujo e Giorni –
A pandemia do coronavírus e as repercussões no Direito de Família – Subtema de hoje: IMPACTO NO DIREITO DE VISITAÇÃO
O cenário mundial de atenção e vigília em virtude da pandemia do coronavírus trouxe novos episódios ao tão delicado Direito de Família. Dentre eles, e merecedor de especial atenção, está o direito de visitação aos filhos, assim, o Poder Judiciário deverá estar atento, desperto e cuidadoso aos casos que nesse tema se apresentarem, afinal, diante da vivência de um momento totalmente atípico e em que devemos ficar isolados, em que devemos ficar dentro de casa, não há terreno para se alegar alienação parental por descumprimento de visitas ou alteração imotivada de cláusula de guarda unilateral e compartilhada.
O Princípio da Proteção Integral da Criança e do Adolescente, estabeleceu como dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, dentre outros direitos, o direito à vida e à saúde, como previsto no artigo 227 da Constituição Federal Brasileira.
Assegurar o direito à vida e à saúde de uma criança, de um adolescente e de um jovem, é garantir-lhe a máxima proteção.
É evidente que o convívio familiar é extremamente importante para o sadio desenvolvimento de uma criança, de um adolescente e de um jovem, porém enquanto vulneráveis há necessidade de se garantir a proteção em todos os aspectos, ou seja, física, moral, psíquica e emocional, e para que isso aconteça de forma saudável, o diálogo entre os pais se torna essencial dadas as restrições vivenciadas, sob pena de se incidir em abuso de direito até mesmo.
É imperioso que os pais se ajudem, e especialmente os que estão separados. Os filhos devem entender, através do próprio genitor que detém a guarda, que o outro está se ausentando por motivo de saúde e de segurança para evitar uma contaminação, e o genitor que faria as visitas, deve se apresentar empático, sensível e solidário ao outro genitor em cada oportunidade de contato com seus filhos, contato esse que se sabe que será remoto como telefonemas, whatsapp, facetime, entre outros) contando aos filhos, que essa é decisão mais acertada. Deve existir responsabilidade acima de tudo, e garantir o bem estar emocional dos filhos, é garantir-lhes o desenvolvimento digno.
Alegações de alienação parental neste momento, sob o argumento de alteração não autorizada ou descumprimento imotivado de cláusula de guarda unilateral ou compartilhada, deverão ser analisadas com extremo rigor pelo Poder Judiciário, sendo que quem assim se portar estará incidindo em abuso de direito por exercer um ato que originariamente foi lícito, mas que agora se apresenta fora dos limites impostos de preservação da saúde da coletividade, afinal, não se estará diante de tentativas de comprometimento do convívio com o outro genitor, mas sim de precauções emitidas pelos órgãos responsáveis, e especialmente da saúde onde a convivência não é recomendada, portanto, alegações de alienação parental neste momento atípico vivido mundialmente, será litigar de má-fé, será abuso de direito, portanto, repita-se: deve existir responsabilidade acima de tudo.
Albert Einstein ensinou que a criatividade é a inteligência se divertindo. Pois bem. O momento está propício para a criatividade dentro do Direito de Família e de modo a garantir o sadio desenvolvimento das crianças, adolescentes e jovens enquanto seres humanos em desenvolvimento, assim, contatos via internet permitirão a manutenção dos laços de afetividade, bastando que os horários sejam ajustados entre os pais em razão da necessidade de adequação ao bem-estar dos filhos a essa nova realidade.
Faz coro e reforça o que foi dito neste artigo o caso prático que apresento abaixo e ao qual peço especial atenção de meus leitores por ter se tratado de fato juridicamente relevante relacionado ao direito de visitação nesse período de isolamento em virtude da pandemia do coronavírus e obtido no site CONJUR (http://www.conjur.com.br), datado de 13/03/2020:
“Um pai foi impedido de ver a filha após voltar de viagem à Colômbia, por determinação do desembargador José Rubens Queiroz Gomes, da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP. A mãe da menina entrou com ação alegando que a criança possui problemas respiratórios graves, o que a inclui no grupo de risco.
A solicitação da mãe havia sido negada em primeira instância, porém o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, julgando a questão em caráter liminar, considerou que “não haverá grande prejuízo se a criança permanecer mais nove dias sem ver o genitor”.
A decisão acolheu parecer do Ministério Público, que também apontou que o direito de conviver com a menina poderá ser novamente limitado caso ele apresente sintomas do coronavírus. Até esta quarta-feira (18), a Colômbia tem 75 casos confirmados.”
Ou seja, preservou-se o direito à vida e à saúde da criança em detrimento do direito de visitação do genitor que não morava com ela. Aplicou-se o princípio jurídico da proteção integral da criança e do adolescente e também o princípio jurídico do melhor interesse da criança.
É dever dos pais proteger seus filhos, portanto, expor crianças, adolescentes e jovens a maiores consequências, especialmente aquelas relacionadas à não preservação da saúde não ponderando sequer aqueles casos em que os filhos possuem doenças respiratórias e que se forem contaminados pelo COVID-19 poderão até mesmo vir a óbito, demonstra atitude abusiva e deformação da hierarquia dos valores que o genitor possui, vez que evidentemente não se estará considerando o direito à vida e à saúde dos próprios filhos como prioritários, mas sim seu poder de impor a vontade à vontade do outro, fazendo um campo de batalha onde deveria ser terreno propício ao diálogo, à solidariedade, ao cuidado, ao zelo e ao respeito, valores essenciais para se apresentar de maneira prática às crianças, adolescentes e jovens.
Pais, respeitem seus filhos. Contem a eles que o momento é de preservação da vida e da saúde de todos, e que justamente por isso, respeitar a orientação de isolamento e sobrepô-la apenas por agora ao convívio com aquele genitor com quem ele não reside, é necessário para que todos fiquem bem e saudáveis, isso é ato de amor, de zelo, de consideração e respeito. Isso não é alienação parental. O momento é atípico, o que enseja atitudes igualmente atípicas. Pais, respeitem seus filhos.
DANIELE WAHL DE ARAUJO E GIORNI, advogada, com escritório na Rua Tamandaré, 252, Vila Ferreira Leão, em Sorocaba/São Paulo. Email para contato: danielewahl@hotmail.com.